Já os nossos corpos mergulharam juntos por entre esta selva de luz roubada, em movimentos perfeitos, em voos alados, numa dança sem fim no centro de um palco sem público. Deixar correr agora cada gota na janela baça... Que desperdicio!

quinta-feira, setembro 30, 2004

Vazio final

Explodi no centro do vazio criado entre o nosso olhar,
Nos silêncios inquebraveis que nos faziam torcer,
Na barafunda da tua passiva ausência a despertar,
Em tudo o que fomos e já não somos... Estamos a morrer.

Num momento único todas as lágrimas, todos os sorrisos
Todos os sonhos a dois colados no nosso céu tão infinito
Os segredos, os corpos delirantes de prazeres prometidos...
Todas as lágrimas,todos os sorrisos, tudo um velho mito.

História urbana, "Foi assim que acabou", a saudade...
"Amo-te" e o rubor aquece, espraia-se-me na pele...
Nada mais viverá por agora nesta nossa pequena tela.

Mas talvez um dia, debaixo do nosso céu enraizado de sonhos,
A dura saudade me enforque num sopro do nosso vento
E voemos novamente os dois, de mão dada nas asas do alento.

segunda-feira, setembro 27, 2004

Pinta-me em ti

Queria apagar as tatuagens, rasgar as telas que pintaram sobre mim, diluir-te um pouco na minha pele... Pintarias para mim? Uma mistura meio mágica, do teu condão em mim infiltrado: sorrisos, carinhos, os nossos pés entrelaçados... Os nossos beijos retratados... As nossas mãos dançantes ao sabor do vento que nos atravessa quando te toco.
Por vezes sinto-me frio... Tenho saudades. Mas estas saudades são daquelas que magoam, das fortes que nos estrangulam, que vêm para nos recordar que nada nunca se repete, nada volta, tudo vai. Nessas alturas beijo-te devagar... Peço-te que me leves o medo, a saudades, as âncoras que teimam em não quebrar. Mas... Pinta isso sobre mim. Uma tela branca... Os beijos, os toques, a tua pele na minha, a vertigem de um orgasmo, a magia da saudade, do tempo, esse assassino. Quero que o pintes como ele é... Azul como meu medo. Assassinou-me, esse tal tempo. Não me lembro bem como foi, creio que ele depois nos leva as recordações também. Mas sei que fui assassinado.
Pinta-me sobre ti também... Pinta-me em ti, na doçura do que nos une... Na tristeza do que nos separa.

Utopia eminente

Encontrei-me no teu sorriso, inqueto como o vento;
Na tua mão que me percorria a pele, de mansinho,
No teu olhar retalhado de cores em movimento,
No beijo com que me assaltaste devagarinho...

Não passarão de um sonho, utopia eminente,
Os momentos e os abraços trocados em segredo
Numa escura rua da triste Lisboa deprimente
Em que nos perderíamos assim, sem medo...

Beijos em doces rodopios... 'Nós'... Como seria?
Tragos de prazer, vertigem na frescura da tua pele
Os lábios ardendo, escorrendo em ti como mel.

Mas aqui de cima percorro-te assim... Sozinho... Sem ti
Rasgado em murmúrios de papel, sussuros perdidos
Na utopia eminente, em voos tristes e tremidos.

domingo, setembro 26, 2004


It's easy to say goodbye

If you're trying to live and wishing to die

It's easy to drink your tears

If you're killing your hopes and kissing your fears



quinta-feira, setembro 23, 2004

Sussuro ausente

Hoje quis apagar todos os momentos errados
Pintados na minha mão em forma de tatuagem.
Rasgar de mim todos os segredos magoados
Que te afastam devagar da 'nossa' miragem...

Sorri com a tua terna redenção ensaiada
Por entre suspiros longos, desmaiados
Até caíres morta na minha sombra deitada
Nos teus cabelos negros e desbotoados.

Ficaria assim até cair de novo...
Coberto da tua cor, do 'nosso' perfume
Agarrando com força aquele toque meloso.

Afinal podemos ficar assim, abraçados no tempo
Que não é meu, nem teu, nem do vazio entre nós...
Mas de um sussurro algures, perdido naquele momento.

segunda-feira, setembro 20, 2004

Lets get retarded?

Dou comigo feito louco, em saltos quase infinitos no meio da sala. Salto, rebento com tudo à minha volta, quebro a bolha rotineira que me inunda a vida diária, destrúo fantasmas. Voo por instantes, num salto louco contra a parede (sempre núa) e lá me deleito com os braços estendidos. Serei louco?
Não tolero o ritmo que me acelera devagar, mesmo devagarinho. Quando dou por mim, lá estou eu naquela reviravolta insana, louca como o meu movimento. Serei uma partícula Brawniana?
A culpa é do som (tem de haver sempre um culpado). É daquela melodia rítmica que me mantém neste estado de hiperactividade. Sinto-me tão bem no movimento louco da cabeça, nas cabeçadas que dou nas partículas de ar que me rodeiam, nos berros que solto no centro de uma roda sem fim.
A culpa é do som... "Lets get retarded"?

quinta-feira, setembro 16, 2004

A tua "saudade" na minha porta

Deparei-me com a tua saudade presa na porta do meu quarto esta noite. Está ali, colada com dois pedaços de fita-cola dourada como o ar que se avizinha, um pequeno papel com uma letra esgafinhada onde se lê "Saudade". Há horas que me mantenho num estado de aceitação perante esta estranha visão mas, agora, pergunto-me de onde veio, quem a colou, como me alcançou?
O papel é branco. A tua pele é branca, não tão branca como o papel-da-saudade-colada-na-porta-do-meu-quarto, mas branca, como a minha. Realmente, que raio de catalogação que me arranjaram - brancos, pretos, amarelos e vermelhos. Não me chega, sempre preferi o laranja ou o verde. Mas o papel faz-me recordar-te, numa tarde, uma única tarde, um toque escondido por um gesto, por um retirar de cabelo... Tão terno...
As letras estão gatafunhadas a um vermelho, tenho receio que seja sangue, mas talvez não. Está assim... Feliz, uma escrita feliz (isso existe?). A saudade pode não ser triste não é? Afinal não preciso de me suicidar todas as noites num berro ou num sussurro, basta deitar-me no chão a soprar as minhas estrelas para te voltar a ver. O problema é que é tudo demasiado irreal. Não te toco, não te cheiro, não te sinto... Mas basicamente é o que vivo instante a instante, todos os dias.
Vou buscar o papel...


"Saudade" colada ao peito, onde tudo me habita e tudo se debate. Começo a sentir um aperto, de certeza que é da fita-cola. Percorro a borda do pequeno papel com os dedos a tremer, a tua cara, a tua pele esquecida debaixo dos meus lençois, aqueles em que nunca penetraste. Mas eu meto-te lá dentro, deito-me com tudo colado ao peito. Colo-te no meu lençol verde-alface, a "saudade" de não te ter, debaixo de mim, no meu quarto escuro, para te sentir. A tua pele está comigo para sempre, debaixo deste lençol fresco, do edredon mais quente, perto da almofada em que te abraço por vezes, o teu toque pertence-me por instantes.
A tinta desapareceu...


Peguei na caneta preta e escrevi, no lugar da "saudade" que me tomava o corpo debaixo dos lençois, "quero-te". Vou colar isto na porta do meu quarto, pode ser que quando vieres buscar o pequeno-papel-da-"saudade"-colado-na-porta vejas que mudei a cor da caneta e agora te quero, "quero-te" mais que a "saudade" que te devorou.

segunda-feira, setembro 13, 2004

Pintura do meu traço (por ti)

Não sei porque me consumo nesta raiva insistente em me devorar. Porque me deixo consumir tão rápido pela falta que me fazes quando não me ligas nenhuma, quando não respondes, quando não falas, quando o silêncio me aperta.
Não entendo porque me deixo ficar à tua espera. Um toque teu, um palavra daquelas que ontem me escreveste, um sorriso teu direccionado à minha troca de olhares.
Não entendo porque choro devagar nesta noite tão escura no canto do meu quarto. O negrume que me cobre, as estrelas das tuas mãos nada perfeitas em mim.
Não entendo porque me quebro neste vento que me assalta a janela fria. Como me deixou levar para bem longe na fugosa lágrima que me ruburiza a cara.
Não entendo porque me pintas em telas negras de um fundo acizentando. Uma cara irregular com um defeito escorrido no olhar, apenas mais um defeito encontrado na total podridão que vais desbravando em mim. Hoje sou protagonista, ontem fui amante de paixões criadas por mim.
Não entendo porque me deixo... Porque me deixo perdido sabendo que a saída está algures aí, talvez num beijo teu trocado em todo este silêncio.
E porque não choras também? Porque não me apanhas no ar enquanto caio?

domingo, setembro 12, 2004

Confusão

As imagens espalham-se pelo caminho que traço com os meus pés arrastejados. Crio pegadas, devagar, lentamente ao som da melodia da tua voz ressonante no meu espírito. Um recital enebriante, bruxuliante no teu tom grave de falar (nunca te ouvi um sussurro). Os nossos olhares, imóveis, numa troca de ternura nunca antes oferecida, um sorriso meio torto que eu não conheço bem.
Instala-se uma confusão de dor e ilusão. Tomo consciência das barreiras que nos separam (pequenas barreiras de papel que podemos derrubar), dos nossos pequenos impossíveis diários, aqueles presos por um fino pedaço de seda arroxeada, a qualquer momento possíveis.
Cheguei a uma encruzilhada... Os pés não arrastam mais, levitam no vazio que me prometes. Afinal nós somos assim: um pedaço de promessas escondidas no canto escuro do olhar, vários retalhos de vazios que nos devoram todos os dias. Nós...
Mas confundo-me aqui, neste espaço enraizado do que não somos e poderemos ser... Queria ser contigo... Ou talvez não.

sexta-feira, setembro 10, 2004

A minha mão na tua cara

Queria ter sido o escolhido. Queria ser eu a limpar-te as lágrimas, ser o que te abraçava e acariciava devagar até tudo desaparecer. “Tudo passa”.E tu sorririas para mim num traço inocente de comforto.
Porque não me usaste como fuga da gruta em que te escondeste? Não serei praia ou porto de abrigo? Não serei suficiente? Parece que não. Bastou ouvirte chamar o nome de outro alguém para saber que no final não serei teu. Devia ser o meu nome a ser pronunciado, apesar das barreiras, dos impossiveis diários com que nos enchemos até rebentar. Devia ser o meu nome a percorrer-te o corpo no sangue azedo. Devia ser minha a mão que vai espraiar-se lentamente na vertigem da tua pele, em contornos perfeitos da tua cara sinuosa. A minha mão... Coberta do sangue que te anuncia em mim.

quinta-feira, setembro 09, 2004

A árvore atrás da colina

No abraço de uma árvore qualquer
Uma corda abraçada a mim
Uma cabeça pendente
Num movimento latente
Um sussurro sem grito
Um charco sem rasto

Os olhos raiados de medo
Alucinações de um beijos seco
Passos percorridos em segredo
Ou os ecos da tua presença

No charco um reflexo sem nexo
Talvez um espelho estragado
De um sorriso perdido
De um olhar rasgado
De uma lágrima arrancada
De um alívio reencontrado

Há uma árvore atrás da colina
Um menino que lá se perdeu

Conta-se lá longe ao sabor do vento
Que aquele menino não voltou
Que foi amante de uma corda
Que num dia de outono o trespassou

quarta-feira, setembro 08, 2004

Suicidio

“Is there anything you want from me
My arms, my life, my energy
I don't know how far I can go
Everything says no
But you know how it goes when
You're used to your side of the bed
I know you don't belong in this room
But you're here now
So what can I do
All that I am is
All I was taught to be
All that you are is
A wall between myself and me
Have you ever really looked at me
Or thought about me secretly
Do I make you wonder at all
About the speed of light
Outside our little world we might not
Feel so alone
I know you don't belong in this room
But you're here now
So what can I do
All that I am is
All I was taught to be
All that you are is
A wall between myself and me”

Posso desaparecer no vento. Deito-me numa folha dourada e vou para longe da morte que te vai devorando. Não te percorro mais os dias. Não violo mais o ar que se tornou teu amante. Não serei sombra sobre a tua janela ou sorriso na vertigem do teu luar.
Rasgo-me em pedaços de carne fria que se estrangulam contra a imensidão a noite que começo a odiar. Deixo tudo e esta é a noite ideal.
Vais dormir com a mesma lágrima presa no mesmo canto do olho que me faz sorrir sem o conhecer. Vou desenhar a tua janela num papel e guardá-lo no bolso. Talvez te veja espreitar por lá nas noites em que me ouves desesperado contra os estilhaços do tempo.
Todas as noites morro num sussurro teu... Esta noite torno-me cinza. Suicido-me no vento que se tornou teu amante.

sábado, setembro 04, 2004

Um dia



Um dia vamos sozinhos nesta rua desmazelada. Vamos de mãos dadas ao sabor do vento sem saber onde nos leva o caminho.
Um dia vamos os dois a saltar de folha em folha como fazem os apaixonados. Vamos por entre os sopros do vento agreste que te cantarão aos ouvidos.
Um dia vamos sentar-nos ali no centro e rir dos nossos sorrisos. Vamos os dois... Sem eu sequer saber quem és.

sexta-feira, setembro 03, 2004

Flores negras

Não sei bem se morri sozinho ou acompanhado pela tua tristeza. Talvez tenha apenas sonhado a tua mão junto do meu peito enquanto me deitava na eternidade... Atirei-me para o manto de flores negras que estava no fundo do teu olhar molhado para não te ver mais, para não te ter mais assim. Sem mim estarás melhor. , Sem mim serás maior. Sou a cinza que te escorre pela pele nas noites de luar. Sou eu quem te mantém morta atrás dos véus que nos separam, sou eu, sempre eu!
Deitei-me e não me arrependo, só tenho medo de nunca mais me levantar. Medo de nunca te chegar a ver. As flores são negras cor do teu olhar, marcam-me a pele em delicados movimentos de ternura, corroem-me a alma em toques suaves, matam-me mais, levam-me mais longe. Levam-me ao azul do céu solarengo, ao medo pintado SÓ para ti, às cadeiras de baloiço que eu não deixo parar, às tua carne pendurada nas paredes do meu quarto, os teus pedaços colados na minha cabeça.
A tua mão... A minha mão... Não estavam juntas quando mergulhei.