Já os nossos corpos mergulharam juntos por entre esta selva de luz roubada, em movimentos perfeitos, em voos alados, numa dança sem fim no centro de um palco sem público. Deixar correr agora cada gota na janela baça... Que desperdicio!

quinta-feira, abril 30, 2009

Léguas


Escorreram-me as lágrimas por entre os dedos
Quando não as consegui conter mais nos olhos
Atados para não te ver.

São caminhos de água numa dança de sangue e pecado consumado pela minha mão na tua pele, branca, ansiosa por mim.

Escorreram-me as lágrimas da boca até ao chão
Em gotas grossas, pesadas, adjacentes a um beijo teu.

E loucos, os meus dedos apertam-me o olhar para nunca mais te ver. Espeto o canto que me resta da unha do indicador direito no centro da tua memória e raspo-a como se o pudesse mesmo fazer. Não posso! Mas vou raspá-la de ti, arrancar-te os olhos em vez dos meus. Não me vês!... E eu não sou teu.

quarta-feira, abril 22, 2009

Letargia do coração

Acordei na letargia dos dias-iguais-a-outros-dias. Nada me embala mas eu sinto que os meus pés não tocam o chão; arrastam-se nas partículas de ar que foste sugando e transformando numa coisa ainda sem nome. Penso mas não executo. Sorrio mas não sinto.
Trago um formigueiro no coração como quando durmo sobre o braço e acordo como se ele não fizesse parte de mim. Atiro-o contra a parede, com força, até que o sinta de novo. Bato-lhe, belisco-o mas no coração não funciona desta maneira.

Ele formiga.
Ele não faz mais parte de mim.

sexta-feira, abril 03, 2009

Rameira.


Vou gravitando pelas vielas escuras de salto vermelho e vestido rendado e desbotado. Sou puta velha, desgastada. Vendo o meu corpo por menos de um sorriso à procura dos teus lábios nos lábios deles.
Vou num desfile cambaleante por entre as luzes ofuscantes no calor húmido das ruas pequenas e fechadas até parar na esquina dos costume, por baixo do toldo azul, ao lado do caixote onde guardo a minha vida. Sou vadia de meias sem qualidade e lábios desbotados do meu próprio sangue.
Estou aqui! Venham e devorem-me. Há feridas e dores e palmadas e chutos na cabeça que só eu consigo oferecer. Há beijos e mordidas e chupões e palavras doces que só eu sei dizer. Venham!... Tentem levar daqui o que ainda não levaram, rasguem-me um pouco mais que o calor é impossível dentro de mim. Batam-me, rebentem-me para eu me sentir viva!

Sou puta velha e desgastada de beijos guardados e oferecidos ao desbarato. Sou o vestido roto que todos vêm e não consigo mais esconder; as meias ragadas nos joelhos (antes fosse de tanto rezar por ti, meu amor. Não é!); os punhos fechados, os lábios estirados, sorriso rasgado e mente perturbada.

Gravito nas vielas, gemo nas camas.

É uma putísse!... (Não é?)