Estou num sítio escuro para não me ver. Creio que tenho de parar. No meu peito há vazios que não se reconstroem mais. Há buracos, gigantes buracos que teimam em crescer e tomar-me como um todo coeso que já não sou mais. Eu tenho de parar!...
Aqui, eu escolho não saber onde vão as minhas mãos depois de me taparem os olhos molhados de outros olhos que já foram os meus. Aqui, eu escolho não me sentir: morrer de mim próprio para não mais me saber.
Falo sozinho do meu mundo em ruptura total por não saber sequer se isto é verdade. No meu peito adensa-se o negrume que me entra pelos poros doridos dos impulsos nervosos que evito sentir com toda a força que posso, com tudo o que ainda consigo ser. Eu estou morto. Estou morto, porra! Não sou mais ele por quem se apaixonam com o sorriso estúpido na cara. Sou o vazio, os buracos imensos cheios do ar que guardei para nunca mais me esquecer de quem fui. Sou as lágrimas secas que desfilam no corredor cravado na outra cara que não sou mais eu. Não sou. Eu não sou.
Acho que tenho de parar. Os buracos não se reconstroem mais. Eu pensei que sim. Achei que podia continuar a oferecer pedaços de mim, pequenos, mesmo pequenos, sem voltar a sentir a falta deles. Eu pensei que voltavam com o tempo, que o tempo era O tempo! Que ele faria as coisas bem de novo. Mas o tempo parou dentro de mim. E eu tenho de parar... porque estou morto. Morto de mim. Morto de nós: eu e os meus buracos vazios.